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PIRACICABANA É CONCORRENTE ÚNICA EM LICITAÇÃO DO TRANSPORTE
Terça-Feira, 31 de Janeiro de 2017

OPINIÃO DO ANÃLISE


Analisar as razões pelas quais apenas uma empresa (a Piracicabana, contratada para prestar o serviço em caráter emergencial há um ano) inscreveu-se no edital de concessão do transporte público em Blumenau é exercício complexo, que demanda conhecimento de causa e a compreensão de diferentes variáveis de mercado. Com o entendimento que temos disponível, fazemos as seguintes observações sobre o assunto:


- Não se pode atribuir a falta de interessados pelo edital à falta de divulgação do processo. Desde o final de 2015, quando o poder público municipal rescindiu contrato com o antigo prestador do serviço em Blumenau, o tema virou polêmica das mais recorrentes na cidade e o assunto esteve em evidência ao longo de 2016 inteiro. Foram raros os dias em que não se falou em Piracicabana, Glória, Rodovel e demais tópicos relacionados a transporte público no município. O próprio edital, submetido ao Tribunal de Contas do Estado antes de ser lançado, em dezembro, gerou bastante discussão e abordagens na mídia, de forma que, para qualquer interessado no assunto, foi possível interar-se dos fatos sem muito esforço.


- O mais importante a ser considerado, em relação a este aspecto, é se eventuais interessados em participar do edital tiveram acesso aos dados, números e estatísticas que permitem calcular com precisão os custos e as receitas envolvidos na oferta do serviço, para medirem o real custo-benefício e fazerem uma oferta adequada durante o processo. Neste caso, contudo, caberia às partes interessadas apontar eventuais dificuldades de acesso às informações, inclusive recorrendo a vias judiciais, coisa que não aconteceu até o momento.


- O valor da passagem proposto pela Piracicabana para iniciar a nova concessão em Blumenau é de R$ 3,90, o que representa um reajuste de 6,8% em relação ao preço atual, que é de R$ 3,65.


Em Joinville, a maior cidade do estado, a tarifa de ônibus é de R$ 3,70 para quem compra o bilhete antecipado e R$ 4,50 para quem paga no veículo; na capital Florianópolis a passagem custa R$ 3,34 para quem paga com dinheiro e R$ 3,50 para quem paga com cartão. Em ambas, contudo, o valor não é reajustado desde o final de 2015, o que deve levar a nova correção em breve. Na vizinha Itajaí, que desbancou Blumenau como terceira economia do estado há alguns anos, a tarifa é de R$ 3,60, mas também está sem reajuste há mais de um ano.


Quando se compara o valor da tarifa nas cidades acima é preciso considerar também que Blumenau tem uma frota de automóveis proporcionalmente maior. Ao se dividir o número de carros emplacados no município (sem considerar, caminhões, ônibus, caminhonetas, motos e utilitários) pela população, chega-se a um coeficiente de 0,52 veículo por habitante. Ao se fazer a mesma conta em Florianópolis, Itajaí e Joinville, chega se a um coeficiente de 0,51, 0,42 e 0,46, respectivamente – os números absolutos você pode conferir na página do IBGE, que disponibiliza informações completas do Censo Demográfico em cada município catarinense.


Com mais gente usando carro, menos gente usa o transporte coletivo e isso faz com que o preço da passagem aumente, teoricamente, segundo a lei da oferta e da procura. Outros fatores e variáveis contábeis interferem na composição do preço, mas este é um aspecto preponderante.


- A se confirmar a Piracicabana como vencedora da licitação – o Serviço Autônomo Municipal de Trânsito e Transportes de Blumenau (Seterb) espera concluir o processo, que envolve a avaliação dos documentos apresentados pela concorrente e prazos para eventuais recursos, em até 30 dias –, será preciso acompanhar com atenção outro aspecto: como a nova concessionária do transporte vai se comportar em relação aos principais pontos do contrato. A renovação completa da frota de 240 veículos, por exemplo, deve ocorrer no prazo máximo de três anos, sendo que 40% dela deve ser zero quilômetro já na arrancada. Ou seja: a Piracicabana vai ter de providenciar quase 100 ônibus novos para começar a operar o serviço. Outros 30% deverão ser renovados em 2018 e o restante em 2019. Não é pouco investimento, então vai ser preciso acompanhar de perto o cumprimento do contrato. Seterb, Câmara de Vereadores e Ministério Público, principalmente, precisam ficar de olho.


- A instituição de um comitê, ou conselho, com participação social para avaliar a qualidade do serviço que será prestado é outro dispositivo do contrato que precisa ser fiscalizado. Neste caso, o principal interessado no assunto é o usuário, que deve exigir a implantação e cobrar resultados da nova esfera a ser criada.  


- O serviço prestado pela Piracicaba, até o momento, parece cumprir pelo menos a média das expectativas. Se a qualidade dos veículos ainda não é a ideal, a regularidade do sistema parece ter melhorado bastante em relação ao antigo operador – pelo menos não se ouviu mais falar em greve na cidade. Desde a chegada do novo operador, os salários da categoria são pagos em dia e isso se refletiu em mais tranquilidade para quem usa o transporte coletivo. Os usuários do sistema, por sua vez, até o momento não apresentaram queixas e restrições mais generalizadas em relação à qualidade do serviço prestado.


O possível e o ideal


Por isso será conveniente que, no caso da Piracicabana ser homologada como vencedora da licitação, lideranças e formadores de opinião do município direcionem o foco de sua atenção para o cumprimento de todas as cláusulas do contrato. Afinal, de nada adiantaria ter vários participantes no processo licitatório se o vencedor, depois, não fosse chamado a arcar rigorosamente com todas as responsabilidades assumidas.


Fazer ilações ou conjecturas que não tenham lastro na realidade, portanto, vai ajudar muito pouco a partir de agora. E a realidade, para o potencial do sistema público de transporte em Blumenau, é que, se a nova concessionária cumprir tudo que está definido no contrato, o resultado já será satisfatório.


Avançar além disso é tarefa que exige bem mais que dispositivos legais. Exige investimento, políticas públicas adequadas e, sobretudo, mudanças de hábito do cidadão. Como a conjunção destes três fatores ainda está distante no Brasil, melhor aceitar e cuidar bem do possível do que ficar sonhando com o ideal.




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