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TEMER PAGA PREÇO POR MINISTÉRIO. DILMA CAPITALIZA ESPERANÇA
Quarta-Feira, 01 de Junho de 2016

Se você estava entre aqueles que pensaram no impeachment como uma alternativa líquida e certa para mudar a situação do país e tirar a economia do atoleiro, já deve ter percebido que as coisas não são tão simples assim. Analisando agora, com mais frieza e distanciamento, percebe-se que o impedimento de Dilma Rousseff (PT) pode ser, no máximo, uma boa oportunidade, se for bem aproveitada. Mas também pode se transformar em um atalho ainda mais curto para o abismo.


Isso ocorre basicamente porque o sistema político e institucional brasileiro, apesar de relativamente estável, continua cheio de vícios e anacronismos que remetem o Brasil ao tempo da colônia, em termos de filosofia e método de gestão. Veja o ministério de Michel Temer (PMDB): por um lado tem composição sólida, principalmente na parte econômica (capitaneada por Henrique Meirelles), mas por outro é um desastre absoluto, com raposas velhas e felpudas cuidando de áreas importantes do poder. Não por acaso, tem-se o cai-cai dos últimos dias. Primeiro foi Romero Jucá (PMDB), pego em flagrante lambendo o bigode ante à tentação de um bote nas galinhas; logo em seguida, foi a vez de Fabiano Silveira ser flagrado em ronda ostensiva ao galinheiro. Contando os muitos vulpídeos que Temer ainda tem alojados em sua equipe, não é de se duvidar que em breve mais algum mamífero sorrateiro seja pego com a boca na botija.


O problema é o mesmo de sempre: para assegurar a tal da governabilidade, é preciso lotear o poder e vender até a mãe do sujeito, se necessário. É o que Dilma e o PT faziam antes, é o que Temer e o PMDB estão fazendo agora. Neste sentido, eles são rigorosamente iguais. A diferença básica é que o peemedebista parece ter um pouco mais de apreço pela responsabilidade fiscal e pelos limites do orçamento. De resto, são absolutamente idênticos, e por isso estavam juntos, aliás.


Pivô


É neste vácuo de semelhança que Dilma e o PT começam a vislumbrar possibilidade concreta de voltar ao poder. Parlamentares já ameaçam mudar de posição e, neste momento, as chances são as mesmas para ambas as partes. E não será nada injusto se houver uma inversão do quadro. Também não se poderá falar em clientelismo ou conspiração se isso acontecer. Não será nenhum “golpeâ€. Será absolutamente coerente e democrático, como foi o processo até agora. Afinal, trocar seis por meia dúzia não é algo que resolva os problemas do país, de forma que relevar esta variável na sequencia do julgamento é tão legítimo quanto aceitável.


Por isso o pivô da partida será a economia – simbolizada na figura do ministro Henrique Meirelles. Se as coisas melhorarem, a economia voltar a crescer e o PIB avançar, trazendo empregos e renda de volta ao trabalhador, dificilmente haveria ambiente para a volta de Dilma e do PT. Caso contrário, a força dos fatos tende a mudar de lado e transformar a vida do atual governo num inferno – até porque o PT vai conspirar a todo vapor na bacia das almas, rogando todas as pragas que estiverem a seu alcance. Este foi o preço aceito por Michel Temer ao formular seu ministério de vulpídeos. Agora a conta chegou e ele começa a paga-la.


Cenários


A esta altura do campeonato, portanto, já se deve trabalhar de forma mais latente com a possibilidade de Dilma Rousseff voltar. Neste caso, haveria dos cenários a se considerar:


1) A presidenta volta e, num arroubo de revanchismo inconsequente, desfaz tudo o que Temer fez (ou o que pretende fazer), re-aparelha o Estado, começa a gastar sem limites outra vez e afunda definitivamente o país na crise


2) Refeita e revigorada pelo susto, Dilma aprende com a lição, revê conceitos e mantém as propostas mais aproveitáveis do governo interino – manter Henrique Meirelles seria uma das decisões mais acertadas da presidenta neste cenário.


Lógica


No caso da manutenção de Temer no poder, é preciso considerar como ficaria seu governo em relação a credibilidade, já que a dança do cai-cai em seu ministério não está pegando nada bem. Os investidores, por exemplo, não iriam ficar muito mais à vontade do que estão hoje, pois um novo impeachment, por exemplo, continuaria sendo possibilidade real e isso não deixaria ninguém tranquilo para investir.


Estes são os cenários que a lógica indica como hipóteses mais evidentes para o curto e o médio prazo. Como se pode facilmente perceber, as perspectivas do Brasil não mudaram muito com a troca de poder. Não há nenhum fator concreto que possa levar o brasileiro a acreditar que o futuro será diferente do presente e do passado, com mais desenvolvimento, mais avanço social, mais estabilidade política e melhor governança pública.


Este cenário de avanços e conquistas só será possível quando o país fizer reformas sérias e comprometidas na administração pública e no sistema político. Até lá, viveremos o eterno dilema de quem vive a trocar seis por meia dúzia, sem nenhuma opção mais atraente.


 


 




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