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O PODER, A RELEVÂNCIA E OS BENEFÃCIOS DO AMERICAN WAY OF LIFE
Sexta-Feira, 25 de Novembro de 2016

O pessoal que não vai muito com a cara do Tio Sam – com todo direito, afinal gostar ou não dele é opção legítima de qualquer um – costuma alegar que os norte-americanos são dominadores e onipotentes, que só agem por interesse, que se sentem os “donos†do mundo e por aí vai.


Bom, de fato eles são os “donos†do mundo – embora tenham esta condição cada vez mais ameaçada pelos chineses. Com o maior PIB do planeta, as empresas mais vitoriosas, o exército mais competente e o sistema institucional mais sólido e equilibrado, nem teria como não serem. Mas o mundo sempre teve seus “donosâ€. Desde o Egito antigo, o Império Romano, a Europa Medieval, as nações industriais e, agora, as potências da chamada era da economia criativa. Enquanto houver competição entre os povos, as nações, os países, as economias e as culturas (o que é natural que aconteça, pois o homem luta entre si pela sobrevivência desde que ainda se sub-dividia em outras espécies), haverá “donos†do mundo, competindo com aqueles que também gostariam de sê-lo mas não o são. Isso é tão natural quanto a incidência de luz solar sobre a superfície da Terra.


A questão central é: como os “donos†do mundo usam esse poder para exercer seu domínio? Para ficar só em comparações mais recentes, comparemos o modelo de dominação norte-americano com o europeu. Lembra como a Europa dominou o mundo entre os anos de 1500 e 1900? Para reavivar a memória basta lembrar do que o espanhol Francisco Pizzarro fez com os Incas, Maias e Astecas na América; o que o português Pedro Alvares Cabral fez com os índios no Brasil e o que outros colonizadores menos célebres mas igualmente violentos fizeram em nome da França no Norte da Ãfrica, da Inglaterra na Ãfrica do Sul, do Japão na Ãsia, da Holanda na Indonésia e por aí vai.


American way of life


Agora tente lembrar ou pesquise sobre algum carniceiro conhecido no elenco da dominação norte-americana sobre o mundo. Vai ser difícil encontrar, simplesmente porque não existe. Nossos vizinhos do Norte levaram o american way of life para o globo terrestre seduzindo as pessoas com ele, e não forçando-as a aceitá-lo. O exército americano nunca precisou ajudar a Coca-Cola a obter territórios para vender sua bebida; a Apple e a IBM jamais recorreram à força para colocar seus computadores nas empresas e nas casas; a Ford começou a vendeu seus carros antes mesmo da Primeira Guerra Mundial; o McDonald´s fez os ingleses trocarem o fish and chips pelo hambúrguer sem jamais se indispor com a rainha; o Google escravizou a humanidade sem soltar uma única espoleta por aí. É a qualidade das soluções do Tio Sam e seu apelo sedutor que dominam o inconsciente coletivo, a cultura e o mercado mundial. É a magia do american way of life que conquista, não sua força bélica – esta é apenas uma consequência do poder econômico.


Na maioria das vezes em que se envolveram em guerras foi por absoluta necessidade. Na Primeira Guerra Mundial, que na verdade foi uma guerra europeia, os EUA sequer meteram o bedelho. Na Segunda Guerra, só resolveram ajudar a Europa a se livrar do pesadelo nazista depois que os japoneses atacaram Pearl Harbor covardemente e mexeram com o brio norteamericano. Aos Balcãs, nos anos 1990, o buon vivant Bill Clinton só mandou tropas porque os carniceiros Radovan Karadzic e Slobodan Milosevic estavam promovendo um massacre étnico comparável ao holocausto nazista e a distância que os EUA mantinham do problema estava ficando constrangedora. Ao Iraque, não é preciso nem fazer força para imaginar  a pressão que George W. Bush sofreu para mandar tropas e caçar Saddam Hussein após o atentado de 11  de setembro.


Santos os EUA evidentemente não são. Já cometeram muitos excessos, como as interferências a favor de ditaduras na América Latina, o embargo econômico inacabável imposto a Cuba por cinquenta anos, as espionagens e atos de contra-terrorismo da CIA e o ataque atômico contra o Japão – neste caso, contudo, vale observar, não como justificativa mas como complemento, que os japoneses também já haviam cometido um número enorme de atrocidades (incluindo o ataque a Pearl Harbor) em seu plano de expansão territorial, iniciado no período de colonialismo asiático e finalizado na Segunda Guerra Mundial.  Na média das variáveis, entretanto, percebe-se que os norte-americanos exercem seu poder com responsabilidade bastante satisfatória. Esperar a perfeição, de qualquer pessoa ou instância, Ã© impossível. Mas para o que se pode esperar de uma liderança global como a dos EUA, eles até que se saem muito bem.


Trumpinho paz e amor


Por isso é auspiciosa e provoca alívio até o momento a conduta do presidente eleito Donald Trump. Bem diferente do candidato fanfarrão e inconsequente da eleição em que derrotou Hillary Clinton, o novo chefe da nação mais poderosa do mundo dá a entender que pelo menos tentará fazer jus à responsabilidade que lhe foi colocada nas mãos. No primeiro discurso após a vitória, Trump mostrou um autocontrole e um equilíbrio inimagináveis até o último dia de campanha, quando ainda falava cobras e lagartos do que lhe viesse à cabeça ou à boca. Respirou fundo a cada palavra, apaziguou ânimos, evitou revanchismo e, sobretudo, passou longe de qualquer traço de regozijo pessoal ou descontrole do ego. Realmente foi surpeeendente. Lembrou até o Lulinha Paz e Amor, em referência ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que em 2002 despiu-se da carapuça inconveniente de comunista para eleger-se presidente do Brasil.


Logo em seguida, Trump sentou-se com Barack Obama, aparentando semblante humilde (por encomenda ou não) e denotando um respeito de lorde perante o adversário que em breve se despedirá do poder para dar lugar a ele. Já nesta semana, o ex-fanfarrão apresentou os primeiros nomes de governo e surpreendeu novamente. Para representar os EUA na ONU e cuidar das relações institucionais da presidência, nomeou duas figuras que bateram de frente com ele diversas vezes na campanha, mostrando que tem pelo menos o bom senso de não jogar lenha na fogueira e a capacidade de trazer o inimigo para perto de si quando não pode vencê-lo. São características absolutamente indispensáveis para alguém que vai exercer tamanho poder e tomar decisões de tamanha relevância para toda a humanidade.


Os EUA seguirão sentindo-se o centro do universo, isso é da natureza deles. Para o norte-americano, aquilo que não fica em seu território é um lugar qualquer sobre o qual nunca ouviu falar e nada conhece. Para boa parte dos norte-americanos a capital do Brasil é a Bolívia, por exemplo – até o ex-presidente Geoge W. Bush cometeu esta gafe certa vez, discursando em visita ao continente. Mas enquanto estiverem exercendo seu domínio com a responsabilidade que exercem hoje, estará ótimo.


Polícia do mundo


Neste contexto, é preciso aguardar para ver qual será a postura de Trump em relação ao Estado Islâmico e ao conflito da Síria. Pelo andar da carruagem, a situação por lá pode ficar insustentável se persistir por muito tempo e aprofundar raízes. Deixar tudo como está até pode ser confortável do ponto de vista diplomático e financeiro para os EUA, que estão participando de forma superficial do conflito – a intervenção norte-americana se resume a bombardeios esporádicos na região dominada pelo Estado Islâmico. Mas do ponto de vista humanitário, considerando a catástrofe migratória que está re-dividindo a Europa e o Oriente Médio, pode ser bem menos confortável. Afinal, se há um bônus para os norte-americanos, no papel de potência hegemônica, também há um ônus, que é ajudar a cuidar da segurança mundial – ou seja, assumir o papel de polícia do mundo. Neste contexto, talvez seja obrigação do Tio Sam enviar seus marines e seals para assegurar um mínimo de paz e segurança para quem está à mercê de Bashar Al Assad, Vladmir Putin e Estado Islâmico.


Assim como ajudaram a salvar o mundo da ameaça nazista na década de 1940, talvez seja hora dos norte-americanos ajudarem a livrar o planeta da ameaça terrorista, que há muito tempo vem ameaçando o mundo com seus atos e ideologias condenáveis. Ou alguém tem alguma dúvida de que acabar com Hitler foi um grande legado dos EUA e seus aliados para a humanidade? Talvez seja hora de repetir a dose.




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