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SE ELES SÃO ASSIM É PORQUE VOCÊ DEIXA
Sábado, 24 de Junho de 2017

OPINIÃO DO ANÁLISE

Suponha que você, cidadão comum, fosse gravado (a) em uma conversa cogitando a cooptação de juízes, promotores e delegados da Polícia Federal. Que nesta conversa desdenhasse de uma iniciativa popular pedindo a aprovação de medidas contra a corrupção. Que zombasse de instâncias de poder encarregadas de combatê-la. Que se colocasse na condição de um agente público achacando um agente privado em busca de benefício próprio, financeiro e eleitoral. Parece lógico pressupor que você teria algum problema com a Justiça, ou pelo menos seria condenado pela opinião pública, ou de quem vive ao seu redor, correto?

Pois bem, a grosso modo foi o que fez o senador Aécio Neves (PSDB) na conversa gravada que teve com o empresário Joesley Batista. Em qualquer país mais desenvolvido e maduro institucionalmente, seria natural pressupor também que o próprio Aécio já teria sido forçado e pegar o boné e ido embora. Não haveria mais clima, nas ruas e nos gabinetes, para sua permanência no poder. Em qualquer meio social mais saudável e menos degradado, condutas como a do tucano mineiro são rápida e severamente punidas, por autoridades ou por cidadãos.

Mas o Brasil é diferente, claro. Aqui o presidente do Conselho de Ética do Senado Federal, João Alberto Souza (PMDB), considera que não há prova nenhuma sobre qualquer irregularidade na conduta de um Senador da República, eleito por milhões de votos (como lembrou o próprio Souza) que aparece zombando das mais altas instâncias de poder da nação e da instituição mais sagrada e soberana de todas, o povo - "eles vão pra rua botar pressão e ele afrouxa", disse, em transcrição aproximada, o senador, referindo-se ao presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM). Na prática, o colega do tucano no Senado recorre à máxima do “cadê as provas?”, tão largamente difundida por aqui nos últimos anos. A despeito da fartura de depoimentos, detalhes, fotos (como a foto de Lula com Léo Pinheiro no Triplex do Guarujá) e malas de dinheiro (como a carregada pelo assessor de Temer no vídeo da PF), há sempre quem veja evidência nenhuma em coisa alguma.

Watergate

Se compararmos o Brasil aos EUA, por exemplo, notaremos que as mesmas medidas têm pesos diferentes lá e aqui. Tomemos o caso Watergate, a título de comparação, que levou à renúncia do presidente norte-americano. O que derrubou Richard Nixon naquele eisódio? Uma gravação, na qual ele era flagrado tomando conhecimento de uma ação ilegal de seu partido, o Republicano, no comitê Democrata, para obter documentos comprometedores que prejudicariam a concorrência na campanha eleitoral que elegeu Nixon. Aqui no Brasil o presidente é flagrado pedindo a um empresário enroladíssimo com a Justiça que mantenha o pagamento de propina a um colega de partido preso por corrupção e nada acontece. O Congresso se mobiliza para salvar-lhe a cabeça, a Justiça faz de conta que não vê e a população diz que é “coisa do PT”.   

Por isso a culpa por esta falta vergonhosa e flagrante de respeito pelo que é moral, ético e legal, em última instância, é dos brasileiros, incluindo os eleitores de Aécio Neves e Michel Temer, que agora estão calados diante dos fatos envolvendo o tucano e o peemedebista.

No caso de Aécio, contudo, pesa o forte agravante de que trata-se da Casa do Povo. O Senado de uma pátria, desde a Roma antiga, é a instância máxima de defesa do que se poderia chamar de interesse público. O imperador César, por exemplo, só foi contido em sua saga de violência e autocracia pela atuação dos senadores mais corajosos, que ousaram arriscar a vida conspirando contra ele. No momento em que o Senado alinha-se ao presidente da república (Michel Temer teria colocado os senadores peemedebistas a serviço da salvação de Aécio em troca de carona vip na candidatura tucana à presidência em 2018*), portanto, para livrar a pele de um senador flagrado em atos nada republicanos, tem-se um fato impiedosamente desalentador para o cidadão brasileiro.

Trecho alterado após a publicação para aprimoramento de conteúdo

Passividade

Se você ainda está passivo diante da situação, pense nisso e comece a se mobilizar. Mudar o país não é só gerar emprego, baixar a inflação e reformar a Previdência. Transformação tem a ver com atitude, e isso não estamos vendo em lugar nenhum neste momento. Nem no topo da pirâmide, de onde deveria partir o exemplo, nem na base dela, de onde deveria partir mais ainda. 




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