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DESEQUILÃBRIO FISCAL E FINANCEIRO ESCURECE O HORIZONTE DE DILMA
Quarta-Feira, 12 de Janeiro de 2011

A pergunta que mais interessa aos brasileiros, neste início de ano, é: como será o governo de Dilma Rousseff? Como ficará a economia e o quadro social do país, que evoluiu a passos largos nos últimos 16 anos mas agora tem ajustes importantíssimos para fazer?


No segundo artigo da série Os Fatos do Ano, na qual o Análise em Foco propõe-se a analisar os acontecimentos mais importantes deste início de ano, apresentamos aqueles que, na visão do portal, serão os três grandes desafios da primeira mulher a presidir o Brasil.


Dependendo de como irá tratar estes assuntos, Dilma poderá fazer um ótimo ou um péssimo governo. Dificilmente ficará no meio do caminho, pois o Brasil, hoje, tem grandes oportunidades e, ao mesmo tempo, enormes desafios para vencer.


A seguir, os fundamentos que, na visão do AEF, o novo governo terá que solidificar para não deixar o país ruir e mantê-lo nos trilhos do crescimento e do desenvolvimento:


 


- CÂMBIO E BALANÇA DE PAGAMENTOS: o real super-valorizado, em relação ao dólar, está fazendo um grande estrago na saúde da indústria e das contas públicas no Brasil. Perde quem exporta, pois os produtos nacionais ficam muito caros lá fora; perde quem vende para o mercado interno, que acaba invadido pelos importados; e perde o governo, que se vê asfixiado por sucessivos déficits na balança de pagamentos, que é a diferença entre tudo que sai e tudo que entra de divisas no país, através do comércio de bens e serviços, das transações financeiras, do pagamento de juros e dos investimentos diretos.


Na raiz da supervalorização cambial, que está levando o Brasil a um perigosíssimo déficit corrente com o exterior, está um outro problema grave: a dívida pública elevada.


Para financiar sua dívida, o governo paga juros elevados – os mais altos do mundo, aliás – para atrair capital especulativo ao país e tomar dinheiro emprestado, já que a poupança interna dos brasileiros não é suficiente para garantir ao Estado a capacidade de pagar todos os “papagaios†que faz.


Hoje a dívida acumulada pelo governo equivale a cerca de 45% do Produto Interno Bruto (PIB). Ou seja: de todas as riquezas que o Brasil produz, quase a metade é destinada ao pagamentos das dívidas que o poder público faz. É como se você trabalhasse metade do ano somente para pagar as dívidas que seu cunhado, irmão, cônjuge ou parente qualquer fez. De um ano inteiro de salários, você ficaria apenas com a metade, entregando o restante, de “mão-beijadaâ€, para que ele, ou ela, pudesse pagar suas contas sem maior esforço, no conforto da mesada gentil.


Para conseguir todo o dinheiro que deve – cerca de US$ 700 bilhões, que é a metade do PIB brasileiro – o governo eleva os juros, atrai a agiotagem internacional e completa a diferença entre o que os poupadores brasileiros oferecem e aquilo que de fato precisa para pagar todas as suas contas, sempre muito mais do que a sociedade brasileira é capaz de poupar.


Atraindo capital especulativo internacional, então, o governo atrai também dólares, que invadem o sistema financeiro nacional e derrubam a cotação da moeda estrangeira frente ao real. Pura lei da oferta e da procura: como os dólares que entram no Brasil para financiar o governo precisam ser trocados por reais, aqui, a oferta de dólares aumenta no mercado de câmbio e o preço do dinheiro do Tio Sam despenca ante o real.


Com o dólar mais baixo, os exportadores padecem e exportam menos. A importação ganha fôlego e os chineses invadem o país, aniquilando a indústria brasileira. O governo e as empresas, cada vez mais endividados, aumentam a remessa de dólares para o exterior ao pagarem suas dívidas.


Assim, instaura-se o ciclo vicioso que faz a saída de dólares ser sempre maior que a entrada no Brasil, que, então, começa a consumir suas reservas cambiais para garantir a oferta de dólares no mercado interno. Quando estas reservas acabam, o país quebra, pois já não tem dólares suficientes para saudar compromissos do país com o exterior. 


Foi o que aconteceu na década de 1980, quando o Brasil ficou sem reservas cambiais e precisou decretar moratória. Ou seja, disse ao mundo: devo, não nego, e pago quando puder.


O Brasil tem hoje cerca de US$ 250 bilhões em reservas cambiais, mas acumula um déficit corrente de US$ 50 bilhões, aproximadamente, com o exterior. À essa razão, garantiria liquidez cambial por cinco anos, não mais que isso. Como as exportações brasileiras estão em queda livre, contudo, é possível até que o déficit aumente significativamente, o que levaria o Brasil à lona antes deste prazo.


Por isso, se Dilma Rousseff não atacar firmemente o desequilíbrio de nossa balança de pagamentos, pode entrar para a história também como a primeira mulher a quebrar o Brasil. Um aspecto de sua biografia que não interessaria a nenhum brasileiro, vale ressaltar. Que ela possa, então, ser bem sucedida na tarefa e evitar um novo colapso cambial.


 


- O TAMANHO DO ESTADO: se os números finais do PIB de 2010 confirmarem as previsões e o Brasil crescer cerca 7%, a era Lula terá terminado com crescimento anual médio de 3,7%. No mesmo período, contudo, o peso do Estado brasileiro aumentou 8% ao ano, duas vezes mais. Dos concursos para contratação de novos servidores ao fortalecimento da máquina estatal, a gestão petista fez crescer substancialmente a presença do poder público na vida dos brasileiros.


O próprio crescimento da economia, em parte, foi obtido pelos cavalos colocados pelo governo à frente da carroça, puxada com vigor e fôlego, graças a esta tonificação muscular extra, promovida por Lula e sua equipe.


A economia brasileira, contudo, precisa crescer mais do que a máquina estatal. É o número de empregados nas fábricas, no comércio e na prestação de serviço que precisa avançar mais rapidamente. Da geração de postos à qualificação dos trabalhadores, o Brasil ainda tem um déficit volumoso para sanar, e não pode fazer isso somente através do inchaço da máquina pública.


Precisa criar um ambiente favorável ao crescimento das empresas, para que possam fabricar e vender mais. Fabricando mais, elas aumentam a oferta de produtos e reduzem preços, diminuindo a pressão sobre os juros, utilizados como mecanismo de controle da inflação. Com juros menores, o governo gasta menos com a remuneração de sua dívida e pode oferecer mais dinheiro, a um custo menor, para que consumidores e indústria sigam fazendo a roda da economia girar.


Um ciclo bem mais virtuoso que o do aumento da máquina pública. Dilma precisará pensar muito sobre isso, sob pena de manter o eterno gargalo para o crescimento do Brasil: juro alto, poupança baixa e investimento irrisório.


 


O FIM DO BOLSA FAMÃLIA: o programa criado por Fernando Henrique, aprofundado por Lula e capitalizado por Dilma foi um importante instrumento para estancar o alastramento da miséria no Brasil e reverter um quadro que se aproximava da convulsão social, em algumas regiões do país.


Hoje, contudo, transformou-se em um câncer que não pára de crescer. No orçamento deste ano, está previsto aumento de 2,1% no total de recursos federais destinados ao programa. De R$ 13,1 bilhões, passará para R$ 13,4 bilhões.


Ocorre que os indicadores da educação no país não estão crescendo em proporção semelhante ao aumento dos gastos com o Bolsa Família, que atrela o recebimento do benefício à matrícula das crianças na escola, por parte das famílias inscritas.


Os índices de matricula até aumentaram, mas a qualidade da formação dos alunos não. Pesquisas recentes mostram que alunos estão saindo do ensino médio com conhecimentos próprios de um estudante da oitava série do fundamental. Neste sentido, poder-se-ia até dizer que o sistema educacional está criando analfabetos funcionais, pois o nível de conhecimento que se exige hoje de um cidadão ou profissional é muitíssimo elevado, bem mais alto que o de 30 ou 40 anos atrás. Já não basta formar, é preciso educar de fato.


Por isso, o governo precisa investir na melhora da qualidade das escolas, não apenas no seu inchaço. O estudante não deve ir às aulas por imposição da família, para que possam comer ao meio-dia e à noite. Precisa ir motivado por um contexto que desperte nele e na família o desejo de educar para prosperar. Isso o Bolsa Família não faz, por isso precisa acabar.


O Brasil precisa se desenvolver, não apenas amparar seus necessitados de forma assistencialista. E educação, para o desenvolvimento, é tão importante quanto o alimento para o crescimento.


Um país que não educa não se desenvolve, e, com quase R$ 14 bilhões, é possível fazer muito pela educação. Bem mais do que se vem fazendo com o Bolsa Família. Dilma também precisa pensar, seriamente, nisso.




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