Análise em Foco > Personalidade
PARA ENGENHEIRO DO COPLAN, BLUMENAU NEGLIGENCIA PLANO DIRETOR
Quinta-Feira, 20 de Agosto de 2009

Os erros mais recorrentes no processo de urbanização de Blumenau são o descumprimento do Plano Diretor e do Código de Posturas, que estabelece regras para o crescimento de uma cidade. Desde 1977, quando foi editado o primeiro Plano Diretor de Blumenau, não houve respeito às regras, especialmente com relação ao sistema viário. Por exemplo: o prolongamento da rua 7 de Setembro em sentido inverso ao da rua Theodoro Holtrup, paralela à rua Joinville. A rua 7 deveria seguir até o cruzamento com a Almirante Barroso. Mas, para atender aos interesses de uma única construtora, que ergueu ali o conjunto de prédios conhecido popularmente como “condomínio dos poetas†– edifícios têm nomes de escritores importantes –, ignorou-se o Plano Diretor.


Outro mau exemplo: o prolongamento da rua Bolívia, até encontrar a rua República Argentina. Depois das enchentes de 1983 e 1984, o Plano Diretor foi transgredido ferozmente pelo impacto avassalador da especulação imobiliária, que aconteceu nos bairros Jardim Blumenau e Vila Formosa (alameda Rio Branco e transversais), na Ponta Aguda, no Centro, no Victor Konder e na Vila Nova, pois os edifícios passaram a ser construídos sem respeitar o número de andares exigido, os coeficientes de aproveitamento e as taxas de ocupação.


ADENSAMENTO PERIGOSO


Em relação ao índice de adensamento urbano, Blumenau não difere de outras cidades de porte médio do país, nas quais houve crescimento desordenado e mau planejamento urbano. As regiões superadensadas da cidade são os bairros que citei acima, e estão todas próximas ao Centro. Também estão se expandindo os bairros da Velha, Itoupava Seca e Asilo. E os prejuízos do superadensamento são claros: a infraestrutura fica deficiente (sistema viário, drenagem urbana e áreas verdes); são criadas ilhas de calor, resultantes do excesso de concreto e de asfalto; a temperatura e a umidade aumentam, diminuindo a qualidade das habitações (casas e apartamentos). Os benefícios, se assim podem ser chamados, é a proximidade de supermercados, shopping center, colégios, lojas, escritórios, bancos, hospitais, clínicas médicas e demais estabelecimentos comerciais, além de estruturas do poder público.


Entendo que hoje a melhor região para se morar na em Blumenau ainda são os bairros já super adensados e também alguns loteamentos residenciais unifamiliares de alto padrão, como o City Figueiras (Vorstadt), Retiro Silvestre (Garcia), Jardim Imperatriz (Velha) e outros localizados próximos ao Centro e aos bairros da cidade que são bem providos de infraestrutura. Mas é preciso estar atento, pois eles podem também ser os primeiros a se tornarem inviáveis.


Com relação à construção do supermercado Giassi no lugar onde está, à qual fui contrário, é interessante porque permite dizer que a atual legislação do Plano Diretor da cidade é esquizofrênica. Pois, afinal, a sua principal lei, que é o Código de Diretrizes Urbanísticas (Lei Complementar nº 142/97), recomenda que grandes supermercados não deveriam ser construídos próximos ao Centro e áreas periféricas. O empreendimento, então, mostra que há, realmente, brechas lamentáveis para burlar as diretrizes urbanísticas. Nosso Código é claro: grandes supermercados e shoppings deveriam ser orientados para a região Norte da cidade, ou às margens da Via Expressa.


Também estão em local inadequado o terminal urbano da rua 7 de Setembro, em frente ao Corpo de Bombeiros; os supermercados Big e Angeloni, ali próximos; o Shopping Neumarkt e algumas concessionárias de vendas de veículos construídas em locais que comprometem o sistema viário. Todos estes empreendimentos foram construídos a partir da década de 90.


FACA DE DOIS GUMES


Quanto ao processo de regularização fundiária, em andamento, tem aspectos positivos e negativos. A inclusão social e a possibilidade dos moradores conseguirem a escritura dos imóveis e a inclusão no mercado imobiliário formal é importante. Mas a regulamentação da desordem urbanística, ocupação das margens de rios, ribeirões e encostas íngremes, além da poluição urbana, são aspectos altamente negativos, cujos principais vilões são o lixo, os resíduos sólidos, óleos e graxas que são levados aos rios pela chuva. Fora o esgoto doméstico, que, geralmente, ali não é tratado.


Com relação ao esgoto, aliás, cabe ressaltar que o projeto de concessão do saneamento está fraudando a Lei Federal nº 11.445/07, que estabelece diretrizes nacionais para o saneamento básico. Quando um processo de concessão de esgoto para a iniciativa privada é apresentado de maneira tão antidemocrática para a sociedade blumenauense, sem transparência das ações e das informações, sem possibilidade de controle social, infringe vários dispositivos do Capítulo I da referida lei, o qual trata dos princípios fundamentais dos direitos do cidadão. Quem tiver dúvida é só dar uma olhada no mapa de saneamento. Faz parte da minuta do contrato de concessão: vão primeiro fazer investimentos nas áreas mais ricas e de classe média alta da cidade, para poderem logo cobrar a tarifa de esgoto e lucrarem. Não vão investir logo nas áreas mais necessitadas da cidade, em locais mais íngremes, onde mora a população de baixa renda.


Já o crescimento residencial de Blumenau, considerando que as encostas do município estão condenadas, deve ser orientado para a região Norte, como, por exemplo, a região das Itoupavas e do bairro Fidélis. No entanto, nessas regiões tem que haver um bom planejamento, em todos os sentidos. E não é o que está se observando na Itoupava Central. Ali, muitos aterros e terraplenagens, destruição de mata ciliar, ocupação indevida das margens de rios e ribeirões e a ausência de uma adequada drenagem urbana já castigam o meio ambiente e ameaçam a segurança das pessoas em épocas de chuva.


As áreas industriais também devem ser concentradas e estimuladas para a região Norte da cidade, próximas ao corredor da BR 470 e ao futuro prolongamento da Via Expressa. No entanto, é preciso critérios e há que se pensar em indústrias não poluentes e de tecnologia de ponta, mesmo porque não restam grandes terrenos em Blumenau para plantas industriais de porte.


O DESAFIO DA INFRAESTRUTURA


No sistema viário de Blumenau, por sua vez, é preciso construir ponte já projetada, próxima ao Centro e que vai ligar a avenida Beira Rio com à rua Chile, na Ponta Aguda. Uma outra deveria ser construída próximo ao trevo do Complexo do Sesi, no Vorstadt, ligando a rua Antônio Treis com a rua Silvano Cândido da Silva Sênior. Devem ser implantados os corredores de ônibus e no futuro o VLT (veículo leve sobre trilhos), que são apostas coerentes sugeridas pela Prefeitura.


Túneis, viadutos e pontes, no entanto, sempre são obras muito caras e difíceis de angariar recursos. Para fazer frente aos problemas de mobilidade urbana que a cidade enfrenta, deve ser estabelecido uma política de nível municipal, que ainda não existe. Aliás, este tema da mobilidade urbana será o principal da 10ª edição da Conferência das Cidades, que será realizada nos dias 1º e 2 de setembro, na Câmara dos Deputados, em Brasília.


Uma das grandes questões, agora, é: Blumenau tem capacidade para crescer até quantos mil habitantes? Ou já esgotamos nossa capacidade? Entendo que o nosso sitio, especialmente depois da ocorrência da catástrofe ambiental de novembro de 2008, encontra-se com a capacidade esgotada. No entanto, se houver um planejamento adequado, talvez a cidade ainda possa comportar mais 100 mil habitantes.


Mas, para isso, vai ter que mudar muito as sua mentalidade, principalmente na questão da mobilidade urbana, e tratar melhor das calçadas e ciclovias. Não é possível a região do Centro da cidade ter as calçadas tão mal cuidadas e mal fiscalizadas. Na Alameda Rio Branco, que está se tornando um logradouro de lojas de grifes e de muitos apartamentos de classe média alta, não poderia estar do jeito que está, com calçadas  arrebentadas, uma pizzaria sendo construída sobre o passeio de pedestres, na esquina das ruas Coronel Vidal Ramos e Nereu Ramos. E o que dizer daquela concessionária de veículos que botou o mostruário de automóveis em cima da calçada, ali na rua Itajaí, próximo ao Hospital Santo Antônio?


UM ACINTE AO CIDADÃO


Estas são situações que caracterizam um acinte ao cidadão e que desmoralizam o processo de gestão e fiscalização do sistema.


Por isso, o poder público precisa ter boa política de controle do fluxo migratório e do crescimento da cidade. Se nada for feito, o resultado será, também, o aumento da violência, que já verificamos em nossa região. Ele tem provavelmente como causas principais o acelerado crescimento demográfico, a falta de políticas municipais de moradia, a endêmica falta de fiscalização, o acentuado processo de migração formando bolsões de pobreza e o assistencialismo de alguns poucos políticos de ocasião que ainda encontram na miséria urbana uma forma de arrecadar votos. Votos que valem telhas, tijolos ou mesmo terrenos ilegais, localizados em áreas públicas, privadas, de margens de rios e ribeirões (áreas de preservação permanente) e de encostas.


Por isso, a existência de uma política esquizofrênica dos fluxos migratórios resulta em violência urbana, que tem sua origem nas áreas periféricas, algumas até bem próximas  ao Centro.


Foi exatamente o que aconteceu nas grandes cidades, onde a presença do poder público ficou cada vez mais fraca, vicejando o crime a instalar-se mais facilmente. Só para se ter uma ideia do tamanho do problema, segundo estudos do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), os custos da violência já tingem 10% de toda a riqueza produzida pelo país, algo em torno de R$ 130 bilhões.


 


Por Arlon Tonolli,  engenheiro civil, membro do Conselho Municipal de Planejamento Urbano (Coplan) e integrante da Associação de Engenheiros e Arquitetos do Médio Vale do Itajaí (Aeamvi).




+ Notícias
Todos os direitos reservados © Copyright 2009 - Política de privacidade - A opinião dos colunistas não reflete a opinião do portal