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MÃNIMO REGIONAL E REDUÇÃO DA CARGA TÊM APELO POLÃTICO, E NÃO ECONÔMICO
Domingo, 13 de Setembro de 2009

Pergunta recorrente nos últimos dias é: de que forma o salário mínimo de Santa Catarina (criado por lei na semana passada e superior ao nacional) e a eventual redução da jornada de trabalho semanal (conforme prevê projeto em tramitação no Congresso) podem afetar as relações entre empregado e empregador?


Quanto ao mínimo regional, o principal impacto, por óbvio, será de índole econômica. Haverá aumento de custo a ser suportado pelo empregador para cumprir os novos patamares salariais. Destaca-se ainda que, além das despesas com o aumento salarial direto, haverá o incremento dos impostos e contribuições a recolher e cuja base de cálculo é a folha de pagamento.


Ainda analisando a questão do mínimo regional, tem-se que não haverá majoração dos salários já praticados em valor superior ao novo patamar. Nesses casos, poderá surgir um segundo impacto, o qual será sentido gradualmente. Trata-se das tensões e insatisfações a serem experimentadas pelo empregado que, atualmente, ganha mais que o colega, por ter mais “tempo de casa†ou por ser mais competente, por exemplo.


A implantação do mínimo regional pode igualar o salário de ambos, o que, para o primeiro, tende a ser visualizado como uma injustiça. Nestes casos, certamente, poderá reivindicar para si, também, um reajuste salarial, o que possivelmente será negado pelo empregador. Afinal, ele já terá que suportar o impacto causado pelo mínimo regional. Isso pode gerar reflexos no desempenho dos empregados e, conseqüentemente, na produtividade e qualidade do trabalho.


REDUÇÃO DA CARGA HORÃRIA


A redução do limite semanal para quarenta horas tem, como principal fundamento, ainda que, inicialmente, assim não se visualize, o aumento dos postos de trabalho. Para alcançar a mesma produção, serão necessários mais empregados para compensar as horas suprimidas com a redução do limite semanal. O aprimoramento da qualidade de vida do trabalhador, claro, também é um de seus objetivos.


A diminuição para quarenta horas semanais, porém, não implica, necessariamente, em aumento salarial indireto ao empregado. Haverá aumento salarial indireto apenas se mantido o valor nominal dos salários praticados hoje. Ou seja, se for pago o mesmo salário por menor número de horas trabalhadas. Assim, claro, o valor pago por hora será mais alto. E, como dito, qualquer aumento salarial, direto ou indireto, gera impactos econômicos nas relações laborais.


Deve-se ter em consideração que a adoção de medidas como o mínimo regional e a redução do limite hebdomadário para quarenta horas, sem contrapartida direta ou indireta do Estado, podem acarretar a redução de postos de trabalho e onerar atividades econômicas a tal ponto de as tornarem insustentáveis. O Estado deve atenuar os impactos destas medidas nas relações entre empregado e empregador, principalmente pela via da necessária e urgentíssima reformulação do sistema tributário.


Para se ter uma ideia, de todos os encargos que incidem sobre o salário, aproximadamente 30% vão para o bolso do trabalhador (férias, décimo terceiro e FGTS). O restante são tributos, que vão para o Erário, entre os quais INSS, Sistema S (Senai/Sesi/Senac) e Seguro de Auxílio ao Trabalhador (SAT), por exemplo.


Embora necessário, não se alcançará melhor índice de desenvolvimento social tão só pelo incremento via lei dos direitos e garantias trabalhistas e sociais. Para tanto, é igualmente indispensável o Estado conferir condições de sustentabilidade do setor produtivo.



CONTAS PÚBLICAS E INFORMALIDADE


As contas públicas também serão afetadas. Em um primeiro momento, o aumento salarial pelo mínimo regional, ou até mesmo o aumento indireto de uma possível redução de jornada sem redução do valor nominal dos salários, encetará um incremento no poder de consumo das pessoas. E, maior consumo, tende a refletir em aumento da arrecadação das receitas públicas.


Porém, se tais majorações onerarem por demais o setor produtivo, paulatinamente haverá a redução do desempenho econômico, acarretando demissões e baixa produtividade. E, a partir daí, a perda de receita. Seria o efeito de “repuxo†produzido por uma onda.


Outro efeito deletério possível, beirando ao previsível, é o aumento da informalidade como consequência do aumento de custos da folha de pagamento. Mas é uma incógnita, não podendo haver uma afirmação ou negação nesse sentido, ainda.


Sobre as chances da redução de jornada ser aprovada no Congresso? Tudo depende para qual direção soprarão as brumas dos interesses dos titulares envolvidos na aprovação de um projeto de tamanho impacto e envergadura.


REDUÇÃO DE IMPOSTOS GERA MAIS CRESCIMENTO


Mas é sempre bom lembrar dos impactos que a redução da carga tributária, esta sim, poderia ter sobre a economia. Lembremos do alívio que o governo deu sobre os impostos da “linha branca†(eletrodomésticos) e dos veículos. Demonstrou quão poderosa ferramenta é o ajuste tributário para propiciar o desenvolvimento sustentável.  Foi medida eficaz contra a grave crise econômica de 2008.


E acredito que, se fosse feito um levantamento, constatar-se-ia que, apesar da redução dos impostos, a conseqüente diminuição dos preços gerou maior consumo e este, por sua vez, compensou perdas na arrecadação. E o melhor: impediu o agravamento do desemprego nesses setores automotivo e “linha brancaâ€.


A atual carga tributária chegou a um ponto insustentável. O quanto e o como se cobra, é um disparate. A revolta é maior se considerado o retorno: em geral, qual a qualidade dos serviços públicos? O Estado está cumprindo com suas responsabilidades institucionais? Está cumprindo com sua missão maior de gerar bem estar coletivo?


Não há dúvidas que a adequação do sistema tributário e de encargos é urgente, necessária e o melhor meio de se fomentar o desenvolvimento sustentável em nosso país. A simples redução da carga tributária sobre a folha de pagamento desestimularia práticas ilegais como pagamento de parte do salário “por foraâ€, não remuneração de horas extras, contratos de trabalho sem registro e o uso fraudulento das figuras dos contratos temporários e de estágio.


CONTO DE HORROR, E NÃO DE FADAS


O setor produtivo, por conta própria, quando consegue alcançar níveis de sustentabilidade e crescimento, tende a repassar parte dos lucros em vantagens salariais e sociais aos trabalhadores. Evidente que não se está a sustentar visão romântica de que basta o aumento de lucros para serem concedidos incrementos de direitos aos trabalhadores.


Todavia, isso é uma realidade na medida que, em situação favorável e de fomento econômico, há menor resistência no atendimento das reivindicações sociais e trabalhistas. Inclusive há menor resistência e danos colaterais quando tais melhorias nos direitos dos trabalhadores derivam de lei.


Mas a reforma tributária é um conto de terror no Brasil, e não de fadas, como queríamos. Os verdadeiros especialistas e pessoas idôneas, com conhecimento de causa, principalmente representantes da sociedade civil, participam para a concepção desses projetos, vitais. No entanto, principalmente no curso da discussão em âmbito político, há uma deturpação generalizada. É uma vergonha. Por fim, apela-se para “remendos†e soluções fundadas em puro casuísmo. Parece um esforço para provar que “nada está tão ruim, que não se possa piorarâ€.



Por Salézio Stähelin Junior, advogado, graduado pela Furb e especialista em Direito do Trabalhador e Processual pela Associação dos Magistrados do Trabalho (Amatra)/Univali. Atua há 13 anos no mercado e traz no currículo causas de volume, como a de ex-funcionários da antiga estatal Telesc. 


 




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