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SUPOSTA VENDA DE OPERADORA EXPÕE DÚVIDAS SOBRE SISTEMA
Quarta-Feira, 07 de Agosto de 2013

O nebuloso episódio da suposta venda da empresa Nossa Senhora da Glória (até agora não confirmada oficialmente por nenhuma parte envolvida) para um grupo mineiro de transporte coletivo enseja três ângulos básicos de avaliação. Um deles aponta para a implicação moral do fato, pois, queira ou não queira, a entrada de um operador “estrangeiro†em Blumenau é, sim, um duro golpe no orgulho dos blumenauenses. Se o serviço vai melhorar ou não, é outra questão. Por ora, o que importa mesmo é que uma das marcas mais importantes da cidade estaria trocando de mãos. É uma realidade da qual não se pode fugir.


O outro foco da abordagem indica simplesmente que, se o atual controlador da empresa de transporte coletivo de Blumenau não foi capaz de geri-la competente e responsavelmente, precisa vendê-la e ponto. O que não se pode é mantê-lo à frente do negócio, tanto por sua implicação social quanto econômica. Para se falar toda a verdade, inclusive, é possível até que a negociação tenha demorado demais.


Um terceiro aspecto a se relevar nesta análise diz respeito à falta de transparência dos processos. Não só dos trâmites que envolvem a transferência de controle da empresa, em andamento, mas de todo o período em que ela prestou o serviço. Afinal, trata-se de uma concessão pública, sujeita, portanto, ao interesse de todos.


Sempre atrás


No caso da Glória, vale lembrar que ela sempre esteve aquém do desejado em termos de qualidade da frota. Em tamanho também, pois uma comparação com Joinville, por exemplo, que tem perfil socioeconômico semelhante a Blumenau, mostra a relação de 1,9 mil habitantes para cada ônibus disponibilizado na cidade do Vale do Itajaí e 1,4 mil habitantes por veículo na congênere do Norte.


Quem já tomava ônibus nas décadas de 1980 e 1990, por exemplo, lembrará que a empresa da família Sackl oferece veículos de má qualidade aos usuários há muito tempo. Enquanto municípios bem menos desenvolvidos e populosos, como Lages, já ofereciam uma frota renovada aos passageiros (a Transul, operadora da serra, rodava com quantidade significativa de veículos novos nesta época), em Blumenau ainda se tomava ônibus fabricado na década de 1960. Os mais “novos†eram de 1970, enquanto aqueles com menos de cinco anos de uso eram raridade.


Nos anos 1990, quando iniciou um processo de “renovação†da frota, a Glória recorreu à compra de veículos usados, adquiridos de uma empresa de Curitiba, que livrara-se deles para comprar outros, novos.


O valor da tarifa, no entanto, sempre foi calculado com base na planilha de custos apresentada pela empresa blumenauense ao Serviço Autônomo de Trânsito e Transporte de Blumenau (Seterb). Ali estão contabilizados todos os gastos com folha de pagamento, combustível, impostos, depreciação de patrimônio, insumos, previsão de investimentos, remuneração de capital e demais itens administrativos de uma contabilidade. Onde foi parar o dinheiro arrecadado com a cobrança da passagem, então? Se ele foi revertido em dívidas e não em investimentos, é porque algo de errado aconteceu no meio do caminho. Os blumenauenses, afinal, sempre pagaram uma tarifa que, teoricamente, remunerava adequadamente o serviço prestado. Conclui-se, portanto, que trata-se de gestão incompetente ou irresponsável. Não há outra hipótese – pelo menos no campo da lógica cartesiana.


Gato por lebre


Assim, resta lamentar não só a venda da Glória (caso ela se confirme), mas toda a falta de transparência que sempre marcou sua trajetória de concessionária pública. Aos gestores públicos, responsáveis em última instância pela concessão, fica um alerta para que estejam mais atentos ao que acontece na contabilidade das empresas contratadas. Caso contrário, os blumenauenses continuarão pagando mais do que deveriam pela qualidade do serviço que a eles é oferecido. Se o dinheiro não está indo para onde deveria, que é a melhoria contínua do sistema, não é problema do cidadão, muito pelo contrário. Alô alô, Ministério Público, o que poderia estar acontecendo? A explicação poderia estar na famosa Caixa Preta do Seterb?


Questões importantes para o debate, em momento tão oportuno.  




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