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RACISMO TEM ORIGEM NA EXPLORAÇÃO COLONIAL
Domingo, 08 de Dezembro de 2013

Na raíz do racismo que domina a sociedade contemporânea, certamente está o processo de colonização que marcou a expansão do império europeu entre os séculos 16 e 20. Principalmente na Ãfrica do Sul, onde a população negra foi alijada de seus mais básicos e elementares direitos, dentro do próprio país, no processo que culminou, na década de 1940, com a criação do abominável regime de segregação conhecido como Aparthaid. Uma cruzada racial com paralelos históricos só identificáveis em massacres como o holocausto judeu da 2ª Guerra Mundial ou a carnificina étnica promovida no Leste Europeu por sérvios e croatas na década de 1980, entre outros genocídios que marcaram época.


Por isso a perda de uma personalidade como Nelson Mandela deve ser momento não só para despedidas emocionadas, ora por razões verdadeiras, ora por demagogias oportunistas. Deve ser o momento de uma reflexão profunda. Deveria incitar iniciativas compensatórias, inclusive.


Sim, pois chega a soar contraditório, paradoxal e irônico que tribunais internacionais como o de Aya, por exemplo, sediado na Holanda, condenem líderes nacionais racistas, como Slobodan Milosevic e Saddan Hussein, enquanto as bárbaras invasões da Ãfrica e a da América, onde também ocorreram verdadeiros massacres étnicos e culturais, seguem sem nenhum tipo de punição ou reparo. Os holandeses, aliás, junto com os franceses e até os alemães, foram os primeiros a subjugar os africanos para saquear-lhes ouro e diamante. Depois chegaram os ingleses, que por lá ficaram e a maior parte das riquezas levaram. Por que Aya não condena, então, a rainha Elizabeth a devolver o ouro e os diamantes que vieram da Ãfrica para enfeitar-lhe a coroa e encher os cofres da Realeza?  


Afirmação racial


O sistema de cotas raciais adotado no Brasil também poderia entrar na cota das reflexões que se farão seguir à morte do importante líder sul-africano.  Afinal, tal mecanismo também acaba sendo uma forma de afirmação do racismo. Se ele é imprescindível ou não para prover a inclusão social dos negros, é outra discussão, mas que ajuda a afirmar o preconceito racial, ajuda. Pois se você diz que uma pessoa tem direito assegurado por lei a um determinado serviço público em função de sua cor, está dizendo também que ela é diferente das demais, e, como tal, deve ser tratada de forma igualmente diferente. Trata-se até de uma derivação inconsciente, produzida na cabeça de quem não tem direito à cota.


Aqui, da mesma forma, o que se poderia fazer de mais efetivo pelos negros é dividir com eles parte da riqueza que foi produzida com a exploração de mão-de-obra escrava nos tempos da colônia. Assim, no lugar de esmolas ao povo, o governo poderia estar distribuindo bolsas de estudo aos negros, para que pudessem se qualificar melhor e competir em pé de igualdade com os brancos na corrida por uma vaga na universidade. Também poderia conceder incentivos fiscais para as empresas que contratassem funcionários negros com o mesmo salário dos brancos, por exemplo – algo que só acontece em menos de 30% dos casos no Brasil.


Inspiração


Na verdade as reflexões que se faz pertinente estimular a partir da morte de uma personalidade marcante como Nelson Mandela não dizem respeito apenas à luta contra o racismo. Qualquer luta, qualquer busca por um objetivo legítimo, como foi o fim do Apartheid na Ãfrica, deve ter no exemplo de Mandela uma fonte inspiradora. Preso por “traição†à pátria pela minoria branca, em um país de maioria negra, ele acabou na prisão simplesmente por não deixar-se cooptar-se pelo sistema. Afinal, bastaria que aceitasse os desígnios de sua origem nobre, de natureza tribal, para que usufruísse de boa relação com os exploradores e passasse a vida como um playboy circulando pelas universidades e resorts do mundo afora.


Mas não, optou por seguir carreira de advogado e embrenhou-se na luta ferrenha contra o racismo. Passou 27 anos na prisão, até eleger-se presidente da nova Ãfrica do Sul, surgida com o fim do Apartheid, nos anos 1990. Para qualquer pessoa ou grupo que pretenda empreender uma luta, então, é preciso fazer saber que a vitória pode custar muito mais do que se pressupunha inicialmente. Sem uma capacidade firme de desapego às coisas, uma perseverança inabalável e uma disposição incansável, nenhuma glória pode ser obtida. Este é o grande exemplo de Mandela.


Líderes com esta dimensão aparecem apenas de tempos em tempos na história da sociedade, então, quando aparecem, deixam um legado inestimável. Um legado que não serve apenas para grupos específicos, mas para toda a humanidade.




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